terça-feira, 14 de abril de 2020

Pensamentos para o próximo Natal...

#TheTimesTheyAreAChanging

Quarentena - dia 25

Cada vez que ponho o pé na rua, seja para um passeio de uns minutos para esticar as pernas, seja para fazer compras no supermercado mais perto, sinto uma vontade simpática de sorrir dos transeuntes, que como eu, não conseguem ficar em clausura doméstica e por isso precisam de circular. Simultaneamente percebo que há um certo sentimento de culpa, que envergonha porque se está na rua, porque se quer ser responsável, mas porque também não se aguentam mais as quatro paredes do nosso lar, por mais simpático e acolhedor que seja.
Mas os tempos estão a mudar e ninguém consegue explicar efectivamente o que se vai passando em Portugal, apenas que estamos a salvar mais gente que noutros países. Quanto tempo vai durar a nossa pena de prisão domiciliária, durante quanto tempo temos que permanecer com esta clausura, quanto tempo teremos para nos reajustarmos à vida real depois deste estado dormente, perguntas que gostaria de esclarecer, também aos que me acompanham em casa. Infelizmente antevê-se um momento seguinte de grande tensão social, de forte penitência dos espíritos livres e dos criadores (depois da dificuldade em sobreviver, a dificuldade em voltar a criar), de enorme controlo colectivo.
Sobreviveremos a tudo isto e voltaremos aos mesmos lugares com a mesma atitude de sempre, pelo caminho perde-se a oportunidade de ouro de mudar de vida realmente.
Agora, como nunca, a necessidade de acabar com este consumismo desenfreado, com este alheamento colectivo por via do mundo digital, com o excesso da valorização do dinheiro em prol do enriquecimento de uma ínfima percentagem da humanidade e o empobrecimento dos restantes 99%, assim houvesse coragem para levar a mudança para diante.
Por estranho que parece, tinha dito exactamente a mesma coisa em 2008, depois da falência de um dos maiores bancos do mundo. Era a oportunidade de ouro para uma revolução verde, para corrigir a trajectória de destruição ambiental e, consequentemente auto-destruição, porém, na altura com menos consciência do que se seguiria a essa crise financeira de consequências ainda sentidas em parte do mundo, mas principalmente, intencionalmente dirigida à ética política e social e aos defensores do bem comum.
Mas infelizmente na altura, como agora, não houve a dita coragem necessária, agora penamos ainda mais porque se instalou uma gente energúmena à frente de países demasiado grandes, uma gente igualmente energúmena vestida de gente sensata à frente de instituições demasiado grandes, uma gente desesperada por 15 minutos de fama, e o resto do mundo que tentará sobreviver o melhor possível. Tudo isto previsível, a dois dedos do nariz e o mundo complacente com a bola de neve a crescer e o previsível desastre colectivo que chegará...
Dizia brilhantemente o filósofo José Gil, ontem, no jornal Público, (...) Resta-nos ver mais longe e prepararmo-nos, com o máximo das nossas forças de vida: esta crise não é independente da crise ecológica que já estamos a viver e que em breve atingirá um patamar irreversível. Aí, e porque para ela não haverá vacina, teremos todos de pôr radicalmente em questão o tecno-capitalismo e os seus modos de vida, se quisermos ter um (outro) destino na Terra.
Eu acrescento: assim tenhamos criado a geração certa para pôr termo a este estado de sítio...

Um abraço felino,
Zorbas

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